domingo, 21 de setembro de 2014

O Efeito Kulechov - por Ismail Xavier


Ninguém mais do que Kulechov vai acreditar na maleabilidade desta unidade mínima: o "efeito Kulechov" é um extremo exemplo disso. A experiência, esquematicamente, consistiu em intercalar o mesmo plano de um ator (portanto, a mesma expressão facial) com três imagens diferentes, de modo a "provar" que, induzido pela imagem acoplada, o espectador daria um significado diferente à mesma expressão facial, o que seria uma demonstração radical do predomínio absoluto da montagem sobre cada imagem singular. Esta experiência teve forte repercussão na Rússia e, em seguida, no Ocidente, sendo amplamente divulgada pelas conferências de Pudovkin, em sua viagem. Na época, era dotada de uma credibilidade que diminuiu com o tempo. O próprio Kulechov, em 1967, nos fornece um relato em que o seu próprio crédito no efeito permanece ambíguo: "eu alternei o mesmo plano de Mozhukin com vários outros planos (um prato de sopa, uma mulher, um caixão com uma criança morta), e os planos (de Mozhukin) adquiriram um sentido diferente. A descoberta me assombrou - tão convencido estava eu do enorme poder da montagem".

Ao conceber a leitura de cada imagem como algo imediato, atribuindo às imagens precedentes um forte poder de indução nesta leitura, o exagero de Kulechov indica o quanto sua teoria do cinema "em geral" aproxima-se das normas do cinema particular que ele defende. A leitura imediata e o privilégio absoluto do fluxo de imagem, são, sem dúvida, propriedades ajustáveis aos limites de um cinema narrativo, baseado nas regras de continuidade e de clara motivação pra a mudança de plano. E, neste aspecto, Kulechov é radical, exigindo que todo e qualquer episódio representado seja necessário para o desenvolvimento da ação, num ajuste perfeito.


(trecho de "O discurso cinematográfico - a opacidade e a transparência" de Ismail Xavier, p. 38)

Em português escreve-se Kulechov, enquanto em inglês Kuleshov.

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